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Relevância da omissão no tráfico internacional de drogas pelo Porto de Santos

Atualizado: 21 de nov. de 2022


Já não causam espanto notícias de quando a Receita ou a Polícia Federal realizaram apreensões de centenas de quilos de drogas no Porto de Santos. Somente em 2018 vinte e três toneladas de cocaína foram apreendidas no maior porto da América Latina, em sua maior parte com destino à Europa.

 

Muitas das vezes (senão todas), a droga é acondicionada em contêineres que transportam mercadorias legítimas, totalmente à revelia dos consignatários, destinatários, transportadores ou depositários.


Isso porque os traficantes e seus intermediários se valem da técnica rip on/rip off loading, que consiste em inserir o produto ilícito em cargas regulares, sem o consentimento dos responsáveis, geralmente com a retirada dos pinos das portas dos contêineres sem o rompimento do lacre.


Referida atividade ilícita é realizada com a participação de funcionários de empresas cooptados pela organização criminosa, que empregam a técnica tanto durante o transporte rodoviário, quanto já a bordo da embarcação mas, principalmente, durante a permanência do contêiner no recinto alfandegado dedicado ao despacho de exportação, conhecido como REDEX.


Talvez visando tais situações é que foi publicada no Diário Oficial da União em 14 de maio de 2019 a Portaria nº 127/2019 da Alfândega da Receita Federal do Brasil no Porto de Santos. A norma determina que a carga de exportação, após o desembaraço e até sua entrega ao operador portuário, fica sob a responsabilidade do administrador do recinto aduaneiro de despacho, que deverá manter vigilância e acompanhar o trânsito da carga, comunicando à Alfândega qualquer anormalidade.


Referida portaria exige atenção redobrada dos administradores dos recintos alfandegados.


Em que pese aparentemente direcionada às obrigações tributárias e alfandegárias, a novel obrigação legal poderá gerar efeitos de responsabilização penal.


O Código Penal, em seu artigo 13, §2º, "a", ao tratar da relevância da omissão, estabelece que "a omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado", acrescentando que "o dever de agir incumbe a quem tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância". Trata-se, segundo Pacelli e Callegari, de uma norma basicamente de proibição, mas que possui uma obrigação de atuar em segundo plano, com a finalidade social de fazer efetiva obrigação de garantia para proteção de bens jurídicos[1].


Nessa perspectiva, a norma editada por autoridade aparentemente competente para tanto, impõe o dever de garante ao administrador do REDEX, amoldando-se a situação prevista pela legislação penal.


Assim, considerando ser o Porto de Santos o principal entreposto da cocaína traficada da Bolívia, Colômbia e Peru à Europa, não é forçado admitir que o Ministério Público Federal poderá, em situações de reiterado uso de determinados recintos alfandegados para a prática ilícita, pleitear a responsabilização criminal do administrador omisso.


É necessário, assim, que os responsáveis pelos recintos alfandegados redobrem as cautelas voltadas a evitar a cada vez mais costumeira prática das organizações criminosas de tráfico internacional de drogas, de forma a elidir a incidência da norma penal às suas atividades.



[1] PACELLI, Eugênio. CALLEGARI, André. “Manual de direito penal: parte geral”. 3ª ed.. São Paulo: Atlas, 2017. Págs. 222/223.

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