Covid-19 e Portos: ANTAQ debate proposta normativa acerca de paralisação de obras portuárias
B20 | Seção: FISCALIZAÇÃO | Página nº 14
A Associação Brasileira dos Terminais Portuários – ABTP, representante de instalações portuárias responsáveis por 14,5% do PIB e 70% da movimentação portuária nacional, questionou, em consulta na Agência Nacional de Transportes Aquaviários – ANTAQ, a paralisação de obras contratuais em função de medidas de lockdown conferidas por Decretos Municipais e Estaduais durante a pandemia do Coronavírus.
Segundo a Associação, as determinações colidem com o fato de os serviços de transporte de passageiros e de cargas terem sido incluídos ao rol do artigo 10 da Lei nº 7.783, de 28 de junho de 1989, conferindo-lhe característica de essencialidade. Ocorre que, desde o início de 2021, medidas que obstam movimentações regulares foram novamente adotadas por tais entes federativos. Desta vez, o setor de construção civil sofreu restrições que culminaram em prejuízos substanciais à continuidade de atividades de instalações portuárias por lei consideradas essenciais.
A título de exemplo, a cidade de Santos impôs medidas emergenciais de lockdown por meio do Decreto Municipal nº 9.270 de 21 de março de 2021. De acordo com o dispositivo, operações atinentes à construção civil seriam suspensas a partir de 23 de março de 2021 – as exceções seriam as obras emergenciais, os serviços emergenciais de manutenção, obras de segurança estrutural e zeladoria pública e privada (art. 6º).
Conjuntamente, a Santos Port Authority, a Delegacia Regional de Santos da ABTP e a SOPESP insurgiram-se contra a determinação da municipalidade. Não obstante, a Prefeitura Municipal de Santos indeferiu a continuidade de obras em instalações portuárias sob o argumento de que o prosseguimento de obras civis da cadeia portuária não tinha caráter emergencial.
Tais atividade, cumpre expor, destinam-se à modernização da infraestrutura portuária com vistas a subsidiar a movimentação de cargas como celulose, grãos e outros gêneros de mercadoria no Porto de Santos. Por conseguinte, dela decorre a viabilidade de investimentos vultosos na cidade e no próprio Porto. Ademais, as mercadorias a serem exportadas prestam-se a garantir a sobrevivência humana uma vez que são, principalmente, alimentos, medicamentos e outros insumos delimitados no artigo 3º, § 1º, inciso XLVIII, do Decreto 10.282/2020.
Diante da paralisação e da desmobilização das obras de infraestrutura portuária em face de Decretos Municipais e Estaduais, e os consequentes entraves e atrasos, a ABTP acionou a ANTAQ para obter orientação normativa quanto às cláusulas contratuais de obras que foram descumpridas, postergadas ou atrasadas por conta dos lockdowns locais de maneira a dirimir o risco de multas, rescisões ou discussões jurídicas futuras.
Sobre o pleito, a Gerência de Regulação Portuária – GRP reconheceu o papel substancial do setor portuário no combate aos efeitos severos da pandemia do Coronavírus e, por isso, entendeu que a consulta da Associação suscita um sopesamento de fatores para garantir uma atuação regulatória da Agência precisa e eficaz: de um lado, há a essencialidade das atividades portuárias e de seus investimentos para aprimorar a eficiência das operações, aumentando a competitividade e o desenvolvimento do país (art. 3º da Lei nº 12.815, de 5 de junho de 2013); de outro, existe a salvaguarda da vida humana em defesa do vírus SARS-Cov-2 (COVID-19) como objeto de políticas públicas locais e regionais.
A setorial técnica arguiu que a situação configura “fato da administração” – instituto do Direito Administrativo que advém de um evento imprevisível, inevitável e não inerente ao risco da atividade, impossibilitando o cumprimento do contrato administrativo pelo contratado, de sorte que sua incidência pode ocasionar a rescisão judicial ou amigável do instrumento, ou até mesmo a paralisação da execução contratual.
Em que pese a diversidade de casos e todas as peculiaridades das razões por inadimplementos, adiamentos e atrasos no cumprimento de obrigações contratuais – as quais podem ser oriundas, inclusive, de fatores alheios à pandemia –, a Superintendência de Regulação – SRG julgou não ser cabível o uso da via normativa para solucionar o imbróglio, porquanto a análise da ANTAQ sobre a matéria deve acontecer individualmente em cada caso concreto, sendo desacertada a adoção de uma regra geral para a situação. Também foi descartado o cabimento de Acordo de Leniência, pois não se discute caso de corrupção e o instituto é de competência exclusiva da CGU no âmbito do Poder Executivo Federal.
Sobreveio decisão da Diretoria Colegiada da Agência, ocasião em que foi acatado o entendimento de impertinência do uso da via normativa para tratar das questões relacionadas ao descumprimento, postergação ou atraso da execução de investimentos devido a restrições estaduais e/ou municipais diante do enfrentamento da pandemia da COVID-19.
Desta sorte, resolveu-se que a ANTAQ deve se debruçar sobre cada demanda provocada diretamente pelos arrendatários ou no âmbito das fiscalizações de investimentos. Nessas hipóteses, “deverão ser considerados os eventuais atrasos nas ações fiscalizatórias, na medida exata em que os impedimentos comprovadamente impactaram nas respectivas obras, casos esses que devem, na sequência, ser noticiados ao Poder Concedente, a quem caberá decidir sobre eventual alteração contratual”, pontuou a Diretora Relatora Gabriela Coelho da Costa [1] .
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[1] 50300.008647/2021-14 (SEI nº 1321089)
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