Demurrage = A+BX?
B15 | Seção: MARÍTIMO | Página nº 27
a = valor de multa;
b = coeficiente que representa a indenização
X = valor do frete
“Não corroboro com o envio dos autos à Procuradoria Federal junto à ANTAQ. A matéria é eminentemente regulatória a ser definida por esta Superintendência. Ora, se há dúvidas na Regulação sobre o assunto, porque julgar que a PFA tenhas as respostas que nós ainda não temos?”
Essas foram as razões da Superintendência de Regulação (SRG) da ANTAQ quanto ao Plano de Trabalho sobre o Tema 2.2 da Agenda Regulatória 2020/2021 – Desenvolver metodologia para determinar abusividade na cobrança de sobre-estadia de contêineres.
A equipe técnica da Gerência de Regulação Marítima (GRM), por meio da Nota Técnica nº 129/2020 havia sugerido a realização de Consulta Interna e Tomada de Subsídios, com o propósito de: 1) alinhar internamente os entendimentos a respeito da natureza jurídica da demurrage; 2) colher contribuições externas que auxiliassem a ANTAQ na decisão de melhor opção regulatória referente à natureza jurídica da sobre-estadia; 3) sondar o mercado a respeito da melhor opção regulatória para aferição da abusividade.
Rejeitada a proposta de Consulta Interna, abriu-se a Tomada de Subsídios com questionário elaborado em ferramenta da plataforma Google no endereço: http://bit.ly/demurrageNM. Perguntas:
1) Dentre as interpretações existentes sobre a natureza jurídica da demurrage, qual melhor se adequa a essa cobrança, indenização ou cláusula penal? Justifique.
2) Pode-se afirmar que o Termo de Compromisso de Devolução de Contêiner (TCDC) assume o caráter de “contrato de adesão”? Justifique.
3) Na hipótese da demurrage assumir a natureza jurídica de cláusula penal, em qual (ais) lei (s) ela melhor se adequa? Por quê?
4) É possível sustentar juridicamente o entendimento da demurrage possuir natureza híbrida, composta de parcela de cláusula penal (multa) e de parcela de indenização (custo de oportunidade)? As práticas de mercado se adequariam a esta definição?
5) Qual a natureza jurídica da demurrage em outros países, cite exemplos?
6) Qual a política regulatória a respeito da demurrage em outros países, cite exemplos?
7) Diante de um preço de referência hipotético, qual a banda, em termos percentuais, você considera justa para a demurrage com fins de verificação de abusividade? Justifique.
8) O valor cobrado de demurrage possui relação direta com o valor do frete presente no BL?
9) Discorra sobre essas opções regulatórias: I – não propor metodologia, mas sim política de ampliação da transparência. Isto é, a ANTAQ poderia solicitar aos armadores que enviassem os valores praticados (valores de tabela) de demurrage e também solicitar aos agentes de carga e/consignatários os valores médios praticados de demurrage. Essas informações poderiam ser disponibilizadas a todos os interessados pela Agência na mídia digital; II – propor ao mercado uma metodologia de precificação da sobre-estadia de referência, exemplo, a partir da fórmula D = a + bX, onde o D = demurrage; a = valor de multa; b = coeficiente que representa a indenização e X = valor do frete. Caso identifique terceiras opções, apresente e justifique.
Há vozes no sentido de que a ANTAQ não dispõe de competência para regular a sobre-estadia do contêiner.
Todavia, o barulho não ecoa: o Supremo Tribunal Federal já reconheceu como abusivo o poder econômico que visa ao aumento arbitrário dos lucros, possibilitando ao Estado regular a política de preços de bens e serviços (ADI 319, Rel. Moreira Alves). No mesmo sentido, a livre iniciativa não legitima a assertiva de que o Estado só intervirá na economia em situações excepcionais (ADI 3512, Rel. Eros Grau) e não pode ser invocada para afastar regras de regulamentação do mercado e de defesa do consumidor (RE 349.686, Rel. Ellen Gracie).
O conceito moderno do Estado reclamou a revisão de suas estratégicas intervencionistas e regulatórias, sendo as Agências criadas justamente para suprir o burocrático processo político legislativo. Atribuir poder normativo à Agência é aparelhar o Estado de forma eficiente, editando normas com viés técnico, tanto para disciplina dos serviços públicos, como para propiciar forte incidência regulatória sobre atividades econômicas da iniciativa privada [1] .
Em outras palavras: nenhum direito é absoluto. Nem mesmo o princípio da livre concorrência da ordem econômica prevista no art. 170 da CF/88.
O grande “X” da questão será: - Sendo a demurrage considerada como matéria eminentemente regulatória, as respostas a tais dúvidas definirão a natureza jurídica do instituto?
Como observou HOSPERS [2] , as palavras são como rótulos que colocamos nas coisas, para que possamos falar sobre elas, "qualquer rótulo é conveniente na medida em que nos ponhamos de acordo com ele e o usemos de maneira conseqüente. A garrafa conterá exatamente a mesma substância, ainda que coloquemos nela um rótulo distinto, assim como a coisa seria a mesma ainda que usássemos uma palavra diferente para designá-la" [3] .
-----
[1] ARAGÃO, Alexandre Santos de, – Agências reguladoras e a evolução do direito administrativo econômico. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 447.
[2] Apud AGUSTIN GORDILLO, Princípios Gerais do Direito Público, trad. de Marco Aurélio Grecco, São Paulo,, Ed. RT, 1977, pág. 2.
[3] De outra forma disse-o SHAKESPEARE, na voz poética de Julieta: "What's in a name? That which we call a rose / by any other name would smell as sweet" (Romeo and Juliet, act II, scene II, in 'The tragedies of Shakespeare', v.1, Randon House, New York, s/d., pág. 302)
Para uma melhor experiência na leitura, considere ler o boletim no formato PDF, através do botão localizado no início da página.