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A sanção política no registro de imóveis

Atualizado: 21 de nov. de 2022

Segundo o Código Civil a prova incontestável da propriedade imobiliária dar-se-á com o registro da escritura de venda e compra à margem da correspondente matrícula do imóvel.



As certidões pessoais evitam que o comprador possa ser considerado como cúmplice em eventual fraude a credores ou em eventual fraude à execução de débitos do vendedor. Uma vez que nosso sistema jurídico assegura que os bens de propriedade do devedor respondem pelas suas dívidas, a alienação destes (inclusive bens imóveis) pode parecer uma forma ilícita de proteção patrimonial e de fraude ao direito de crédito dos credores.

Dessa forma, as certidões pessoais, no processo de alienação de bens imóveis, garante que o vendedor/devedor não foi reduzido à insolvência com a venda do imóvel em conluio fraudulento com o comprador. Os Tribunais têm considerado que a falta de apresentação de tais certidões pode comprometer a eficácia da venda perante credores do vendedor, diante de eventual presunção de existência de fraude.

No entanto, no que tange à apresentação de certidões fiscais, há séria discussão quanto à obrigatoriedade de apresentação destas, por se considerar como sanção política.

A utilização pelo legislador de meios indiretos coercitivos de cobrança do crédito tributário, através da imposição ou limitação no âmbito administrativo, criando obstáculos à pessoa física ou jurídica no exercício de seus direitos, e, assim, obrigando-as a quitar os tributos, chama-se “sanção política” e é combatida tanto na jurisprudência quanto na doutrina.

Exemplo clássico de sanção política é a necessidade de se recolher IPVA atrasado quando do momento do licenciamento do veículo automotor perante a autoridade pública competente.

Da mesma forma, a exigência das certidões negativas de tributo para que a escritura de venda e compra seja registrada à margem da matrícula do imóvel é uma clara sanção política.

O Poder Judiciário tem se manifestado no sentido de coibir tais práticas diante de eventual inconstitucionalidade do texto de lei que institui a exigência de apresentação de certidões negativas tributárias.

A inconstitucionalidade se dá, principalmente, pela negativa de exercício do direito do cidadão ao devido processo legal (art. 5º, XXXV, CF/88). O due process of law é a vítima imediata da utilização da sanção política, diante da negativa de exercício pelo contribuinte do direito de questionar e rever o crédito tributário tanto no âmbito administrativo, quanto no judicial. Se quiser praticar o ato do registro da escritura de venda e compra, e possuir um débito tributário, teria que, a princípio, quitá-lo para conseguir exercer livremente esse direito. E isso é clara e inquestionável coação praticada pelo Estado.

A sanção política impede a utilização dos instrumentos previstos em lei para a apuração e cobrança dos créditos tributários, através da execução fiscal, por exemplo.

Segundo o Supremo Tribunal Federal, no RE 374.981/RS relatado pelo Ministro Dr. Celso de Melo, a utilização de meios gravosos e indiretos de coerção estatal, através da sanção política, destinados a compelir o contribuinte inadimplente a pagar o tributo, é limitação arbitrária que não pode ser imposta pelo Estado ao cidadão em débito, sob pena de ofensa ao due process of law, uma vez que o cumprimento das obrigações tributárias possui formas próprias de exação previstas em lei.

O Supremo Tribunal Federal já editou os enunciados das súmulas 70[1], 323[2] e 547[3] condenando a sanção política como meio coercitivo extrajudicial para o recebimento de tributos, o que tem sido repetida pelos Tribunais Estaduais[4] no âmbito do registro imobiliário.

A negativa de registro autoriza a tomada de medidas judiciais pela parte interessada para assegurar o exercício de seu direito, afastando a aplicação da sanção política, diante da clara inconstitucionalidade de requerimentos e obrigações no sentido de coagir o contribuinte a recolher o tributo de forma extrajudicial.

[1] Súmula 70/STF: “É inadmissível a interdição de estabelecimento como meio coercitivo para cobrança de tributo”. [2] Súmula 323/STF: “É inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos”. [3] Súmula 547/STF: “Não é lícito à autoridade proibir que o contribuinte em débito adquira estampilhas, despache mercadorias nas alfândegas e exerça suas atividades profissionais”. [4]APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA – Mandado de segurança – Pedido de registro de escritura de compra e venda junto a Oficial de Registro de Imóveis – Exigência de certidão negativa de débitos tributários federais – Sentença de concessão da segurança – Irresignação da FESP – A jurisprudência do STF é pacífica em declarar inconstitucionais normas que impõem sanções políticas a coagir contribuintes ao pagamento de tributos por vias oblíquas – Condicionante prevista no art. 47, I, "b" e no art. 48 da Lei nº 8.212/91 que não se sustenta, sob pena de violação do direito ao livre exercício da atividade econômica e da livre concorrência – Exigência não prevista nas Normas de Serviço da Corregedoria Geral de Justiça, em seu Tomo II, Capítulo XX, Seção II, Subitem 119.1 – Precedentes desta Corte de Justiça em casos semelhantes – Manutenção da sentença de concessão da segurança – Desprovimento do recurso voluntário e da remessa necessária. (TJSP; Apelação / Remessa Necessária 1012455-20.2020.8.26.0053; Relator (a): Marcos Pimentel Tamassia; Órgão Julgador: 1ª Câmara de Direito Público; Foro Central - Fazenda Pública/Acidentes - 6ª Vara de Fazenda Pública; Data do Julgamento: 02/02/2021; Data de Registro: 02/02/2021)

 
 
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