A, aparentemente, infindável controvérsia relacionada ao índice de correção aplicável aos créditos trabalhistas reconhecidos em juízo ganha um novo capítulo... talvez não tão novo assim.
Foi publicada, na presente data (03/03/2020), decisão monocrática de lavra do Ministro Gilmar Mendes cassando acórdão do TST que referendara a aplicação do IPCA-E em detrimento a TR, para que outro seja proferido em substituição (ARE 1.247.402). Isso porque a Corte Trabalhista tem se escorado em errônea aplicação da jurisprudência do STF, já que os julgados proferidos no Tema 810 e ADI 4.357, comumente citados, tratam de situações absolutamente distintas (condenações impostas à Fazenda Pública).
Ora, não é de hoje que alertamos que a Corte Maior ainda não abraça a denominada “Teoria da Transcendência dos Motivos Determinantes”. Em outras palavras, os fundamentos determinantes de suas decisões não são dotados de efeito vinculante, de modo que eventual declaração de inconstitucionalidade – ou constitucionalidade – circunscreve-se à norma específica objeto de apreciação.
Por sua vez, o tema não foi em momento algum enfrentado em sistemática de repercussão geral ou controle concentrado de constitucionalidade, o que somente está previsto para ocorrer no dia 14 de maio deste ano (ADCs 58 e 59 e ADI 5.867).
Dito isso, em nosso sentir, revela-se inadequada a declaração de “inconstitucionalidade por arrastamento” pelo Tribunal Pleno do TST dos dispositivos e expressões que fazem referência à TR. Aliás, esclareça-se que a "inconstitucionalidade por arrastamento" é fruto de construção jurisprudencial do STF e alude à possibilidade daquela Corte declarar inconstitucional norma DEPENDENTE ou INTERDEPENDENTE de outra já declarada inconstitucional, o que não é o caso.
Implica dizer que a Justiça do Trabalho não poderá se posicionar pela aplicação do IPCA-E (aqui, ignora-se a possível conversão da MP 905/19 em lei)? Não poderá sob o fundamento de estar seguindo a Jurisprudência do STF. Nada mais.
Claro que há outras questões que nos levam a questionar essa possibilidade, como, por exemplo, a vedação ao Poder Judiciário para substituir índice de correção monetária estabelecido em lei, atividade privativa do Poder Legislativo (princípio da separação dos poderes), conforme já se pronunciou o STJ em incidente de recurso especial repetitivo (Tema 731)[1] e, invocando-se por analogia, o próprio STF ao editar a Súmula Vinculante nº 4[2]. Esse debate, porém, fica reservado para um outro momento.
[1] Tema 731 - Tese Firmada: A remuneração das contas vinculadas ao FGTS tem disciplina própria, ditada por lei, que estabelece a TR como forma de atualização monetária, sendo vedado, portanto, ao Poder Judiciário substituir o mencionado índice.
[2] Súmula Vinculante STF nº 4: Salvo nos casos previstos na Constituição, o salário mínimo não pode ser usado como indexador de base de cálculo de vantagem de servidor público ou de empregado, nem ser substituído por decisão judicial.