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Apreensão de passaporte, suspensão de CNH e liberdade de locomoção conforme a jurisprudência


Há algum tempo discute-se, no meio jurídico, a possibilidade de apreensão de passaporte ou suspensão da carteira nacional de habilitação (CNH) do devedor como meio coercitivo de pagamento da dívida na fase de execução do processo.

O tema é tão polêmico que ainda não há um posicionamento pacificado, tendo em vista a divergência acerca das teses apontadas tanto pelos magistrados, quanto pela doutrina.

Há quem entenda que se trata de uma medida excessiva, que vai de encontro à liberdade de locomoção do indivíduo, prevista no inciso XV do artigo 5º da Constituição Federal.

Além disso, havendo vários meios para prosseguir com a execução, o juiz deverá ordenar aquele que for menos gravoso ao executado, conforme elenca o caput do artigo 805 do Código de Processo Civil. Como exemplo, tem-se o julgamento dado pela Quarta Turma do STJ (Agravo Interno no Agravo em Recurso Especial nº 1283998/RS), com o entendimento de que as referidas condutas “seriam excessivamente gravosas ao executado e desproporcionais à obrigação de pagamento do débito [...]. ”

Por outro lado, há quem admita a possibilidade de apreender passaportes e suspender carteiras de habilitação como meios de coerção para que o devedor pague a dívida ou apresente bens passíveis de constrição, com base no artigo 139, inciso IV e artigo 805, parágrafo único do Código de Processo Civil.

É o caso do entendimento proferido no acórdão do Agravo de Instrumento nº 2196977-38.2017.8.26.0000, julgado pela 1ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que entendeu tratarem-se de “medidas atípicas pleiteadas determináveis com fulcro no art. 139, IV, do CPC/2015, que ampliou as providências à disposição dos magistrados para além da penhora e da expropriação de bens como meios de cobrança, além da “situação processual que justifica a adoção das indigitadas providências, em razão do insucesso de todas as medidas anteriormente tomadas”.

Nesse contexto, o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça caminha para a tese de que a medida de apreensão de passaporte e suspensão da CNH do devedor é excessiva e desproporcional, por ter caráter punitivo e não constritivo, ferindo, assim, a garantia constitucional de liberdade de locomoção.

Recentemente (acórdão publicado em 15.08.2019) a Primeira Turma concedeu habeas corpus (HC nº 453.870) para suspender a decisão do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná que, em execução de condenação por improbidade administrativa, mandou apreender o passaporte e suspender a CNH do ex-prefeito de Foz do Iguaçu/PR.

O referido habeas corpus originou-se de execução fiscal movida pelo Tribunal de Contas do Estado do Paraná que responsabilizou o supracitado município por débitos trabalhistas decorrentes da terceirização ilícita de mão de obra. Como consequência, o município ajuizou uma ação regressiva em face do ex-prefeito que ocasionou a emissão da certidão de dívida ativa e início da execução fiscal em face da ex-autoridade.

Em primeira instância, foi determinada a penhora de 30% de seus vencimentos, o que foi efetivado. Em sede de recurso, o Tribunal De Justiça do Estado de Paraná deferiu o pedido do município para inscrever o réu em cadastro de inadimplentes nos órgãos de proteção de crédito, bem como determinou a suspensão de seu passaporte e CNH para coagi-lo a pagar o débito integralmente.

O ex-prefeito, inconformado com a decisão do mencionado Tribunal, impetrou habeas corpus com a alegação de desproporcionalidade da medida, uma vez que já estavam sendo retidos 30% de seus ganhos para sanar a dívida, além dos inúmeros prejuízos que a restrição dos documentos poderia lhe causar.

Para o relator do HC, ministro Napoleão Nunes Maia Filho, a medida adotada pelo TJPR foi excessiva, uma vez que o réu “foi submetido à notória restrição do direito constitucional de ir e vir, num contexto de execução fiscal já razoavelmente assegurada”.

Ressaltando-se o fato de que, no caso concreto, a execução fiscal estava assegurada em parte pela penhora de 30% dos proventos do ex-prefeito, o julgado proferido no HC nº 453.870 traz um importante parâmetro para limitar o deferimento indiscriminado de medidas de constrição excepcionais como apreensão de passaportes e suspensão de CNH.

Contudo, a discussão acerca do tema está longe de ser finalizada, tendo em vista a quantidade de argumentos válidos apontados na defesa das duas teses, razão pela qual a jurisprudência dá indícios de que irá analisar em cada caso concreto a possibilidade de aplicar ou afastar o cabimento de medidas coercitivas excepcionais.

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