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Direito ao esquecimento no Século XXI: aspectos polêmicos


Do inglês “right to be forgotten”, conhecido no Brasil como “direito ao esquecimento”, pode ser definido como o direito que cada indivíduo possui de que seja retirado ou não levado à exposição pública determinado fato, verídico ou não, que possa lhe causar transtornos.

Não obstante o tema seja debatido por juristas em diversos casos ao longo da história[1], é na última década que o direito ao esquecimento ganhou maior notoriedade, tendo em vista o avanço da internet e a facilidade de acesso e disseminação de informações.

Não por menos, o direito ao esquecimento ganhou um artigo próprio no corpo da GDPR (Regulamento Geral de Proteção de Dados, em inglês), a qual estabelece o direito “de obter do responsável pelo tratamento o apagamento dos seus dados pessoais”, com algumas ressalvas.

No Brasil, está genericamente previsto nos direitos fundamentais à inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem[2], bem como no princípio da dignidade da pessoa humana[3]. Mais precisamente, pode ser encontrado no Enunciado 531, da VI Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal (CFJ)[4], mas o país ainda carece de legislação e regulação específica sobre o tema[5].

Dentre os diversos pontos polêmicos que envolvem o assunto, destacam-se aspectos técnicos da efetividade das decisões judiciais, porquanto, exemplificativamente, uma medida que imponha a um determinado site (Jornal de Notícias ou YouTube, por exemplo) que retire um link por ele ou nele publicado não se demonstra eficiente para que o fato seja apagado e impedido de ser novamente disponibilizado na internet.

No mesmo sentido, determinar aos motores de busca (Google, por exemplo) que removam estipulado fato dos resultados de pesquisa, revela-se tecnicamente complexo e insuficiente para resolver a questão, além de retirar a neutralidade e a razão de ser de um motor de busca.

Outro equívoco técnico é a imposição da obrigação a apenas um ou outro site, bem como um ou outro motor de busca (por exemplo, determinar que apenas o Google, a Microsoft e o Yahoo! ocultem dos resultados das pesquisas algum fato). Certamente, o fato ainda continuará disponível em sites e motores de busca menores, não abrangidos pelas decisões judiciais.

Nesse sentir, olvida-se que a internet não pertence isoladamente à uma pessoa, à uma empresa ou a um país, e atua de maneira global e isonômica, enquanto leis e decisões judiciais abrangem um indivíduo ou uma coletividade, dentro dos limites da jurisdição de uma nação. Destarte, não é adequado e eficaz que o Poder Judiciário obrigue apenas uma ou outra empresa a retirar algum link ou seu respectivo resultado em pesquisas online.

Ademais, a maior discussão acerca do assunto se concentra no conflito existente entre o direito ao esquecimento e o direito à liberdade de expressão[6], de informação[7] e de imprensa[8]. Como ambos os polos desse entrave possuem respaldo constitucional, a maior parcela da doutrina e da jurisprudência, bem como a GDPR, adota um posicionamento mais equilibrado, que não considera nenhum desses direitos fundamentais como absoluto, devendo ser analisado o caso concreto.

Desta feita, deve-se redobrar a atenção para que o direito ao esquecimento não se torne um instrumento facilitador para censura, corrupção, lobbies ou questões políticas. Hipoteticamente, determinado indivíduo, envolvido na operação lava-jato, poderia obter uma decisão judicial favorável que determinasse a remoção de todas as notícias que o liguem com o (até então) maior escândalo de corrupção do país, restando disponível na internet apenas o que lhe convém.

Assim, espera-se dos operadores do Direito esmero na discussão e aplicação do direito ao esquecimento, atentando-se para o caso concreto, para que se torne uma verdadeira ferramenta de avanço na proteção dos direitos fundamentais, ao invés de retrocesso da sociedade, sob pena de se vilipendiar direitos e garantais arduamente conquistados ao longo de gerações.

[1] Casos norte-americanos Melvin v. Reid e Sidis v. FR Publishing Corp.

[2] Artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal e artigo 21, do Código Civil.

[3] Artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal.

[4] “A tutela da dignidade da pessoa humana na sociedade da informação inclui o direito ao esquecimento.”

[5] Projetos de Lei nº 1.676/2015, 215/2015, 2.712/2015, 7.881/2014 e 8.443/2017, sem prejuízo de outros.

[6] Artigo 5º, inciso IV e artigo 220, ambos da Constituição Federal.

[7] Artigo 5º, inciso XIV, da Constituição Federal.

[8] Artigo 220, § 1º, da Constituição Federal.

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