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Resolução normativa nº 18/17: a ANTAQ dispõe de legitimidade para estabelecer direitos e deveres?


O primeiro artigo da série “Resolução ANTAQ nº 18/2017: Novo Marco Regulador do Transporte Marítimo” trouxe considerações de nosso colega e amigo Marcel Stivaletti sobre a conduta adequada e esperada dos agentes de carga na cobrança de demurrage.

Referido artigo nos fez refletir e gerar uma provocação.

Muito se cobrou, e ainda se cobra, que a ANTAQ não tocou na “ferida” da demurrage. É fato que ninguém melhor que ela estaria apto a disciplinar acerca da sobre-estadia do contêiner. Definiu-se no art. 2º, XX: “valor devido ao transportador marítimo, ao proprietário do contêiner ou ao agente transitário pelos dias que ultrapassarem o prazo acordado de livre estadia do contêiner para o embarque ou para a sua devolução”.

A ANTAQ definiu a sobre-estadia de contêiner como um VALOR.

Ponto.

Isto, por si só, é um bom norte para que o Judiciário reveja seu posicionamento, com todo o respeito, equivocado.

Equivocado porque, através do precedente REsp n. 1.286.209/SP, o STJ estabeleceu que a sobre-estadia de contêiner é uma indenização e, por ter esta natureza, o valor que dela se cobra pode atingir montante expressivo em razão da desídia daquele a quem competia a devolução do contêiner. Para o Judiciário, esta desídia na devolução não justifica a redução da cobrança, ainda que vultosa, sob pena de se premiar a conduta faltosa da parte devedora. Para chegar a esta conclusão o STJ apoiou-se em: (1) doutrina utilizando a analogia da sobre-estadia de navio, (2) jurisprudência firmada em analogia da sobre-estadia de navio e (3) Circular Bacen nº 2.393/93, lá definida como “indenização convencionada”.

Até a edição da RN 18/17 não havia norma alguma que definisse a sobre-estadia de contêiner.

Agora, com base na normativa, o Judiciário tem o dever de reabrir a discussão, interpretando o conceito da sobre-estadia de forma sistemática a um dos principais objetivos da RN 18/17: inibir cobranças de sobre-estadias de contêiner em valores desarrazoados, compreendido aqui na redação do art. 5º da RN 18/17: “Os transportadores marítimos e os agentes intermediários devem abster-se de práticas lesivas à ordem econômica por meio de atos sob qualquer forma manifestados, independentemente de culpa, que tenham por objeto ou possam produzir os efeitos, ainda que não alcançados, de limitar, falsear ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência ou a livre iniciativa, aumentar arbitrariamente os lucros, ou exercer de forma abusiva posição dominante.”

A iniciativa da RN 18/17 se mostra em perfeita sintonia à Lei nº 10.233/01, donde prevê que a ANTAQ ao tomar conhecimento de fato que configure ou possa configurar infração da ordem econômica, deverá comunicá-lo ao CADE, à SDE ou SAE (art. 31).

De acordo com a fala do Diretor da ANTAQ Mario Povia na audiência pública realizada na Câmara Municipal de Santos no dia 1º/02/2018 (23’:24”): “a questão da sobre-estadia do contêiner, nós não entramos na questão de natureza jurídica, nós não entramos na questão de modular preços, nós achamos que haveria um custo regulatório grande e nós não teríamos séries históricas confiáveis e neste momento nós não estamos enfrentando esta questão, mas não eliminamos a possibilidade já no próprio avanço normativo, no próprio amadurecimento deste tipo de regulação de mais adiante enfrentarmos isso, mas por ora, ficou realmente em termos conceituais.”

Portanto, respondendo à pergunta que serviu de título a este artigo, temos: a ANTAQ não só dispõe de legitimidade, mas sobretudo, tem o dever de, enquanto ente técnico especializado, estabelecer direitos e obrigações do setor, desde que em consonância à lei, sem os quais, não haverá reviravolta alguma da indústria da demurrage na cúpula do Judiciário brasileiro.

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