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Importação de ... lixo?

Na dinâmica da globalização, do crescimento do comércio exterior e das atividades de apoio ao transporte marítimo, é preocupante o surgimento de episódios envolvendo o fluxo de importação de resíduos para o Brasil. Países como Reino Unido, Estados Unidos e Alemanha já receberam de volta toneladas de lixo importadas ilegalmente.

Com a crescente sensibilização ambiental e o endurecimento das sanções contra os poluidores, o desafio do Estado e da Sociedade tem sido o de apresentar soluções dinâmicas para o problema, equacionando interesses econômicos e sociais em benefício da sadia qualidade de vida e do equilíbrio dos ecossistemas.

Nas empresas, a noção de governança tem produzido profundas transformações nos valores e ações de cada companhia. A proteção ambiental não deve ser apenas uma obrigação, mas também uma ferramenta nas mãos das lideranças empresariais.

A aprovação da Medida Provisória nº 563/12 (MP 563/12) traz novidade jurídica para o setor dos terminais e recintos alfandegados. Estamos falando do artigo 36 da MP, que trouxe nova sistemática para os casos envolvendo importação ilegal de mercadorias prejudiciais ao ambiente, à segurança e à saúde humana.

Preocupa-nos se a MP 563/12 alcançou a perspicácia necessária para proteger o ambiente sem tolher a atividade econômica ou sem propiciar futuros reflexos negativos para o desenvolvimento das riquezas e sua difusão social.

Notamos que a MP 563/12, de plano, possui inadequação formal. As medidas provisórias subordinam-se às regas de elaboração de normas contidas na Lei Complementar nº 95/98. Segundo essas regras, é vedado ao legislador reunir matérias estranhas ao objeto ou sem afinidade ou pertinência com a matéria principal.

O que vemos na MP 563/12 é uma “colcha de retalhos” legislativa, por meio da qual a Chefia do Poder Executivo buscou aprovar uma pletora de matérias estranhas entre si. Dentre elas, a mudança nas regras sobre a importação desautorizada de resíduos poluentes.

Também na MP 563/12, encontramos a medida administrativa de destruição da carga ilegal ou sua devolução à origem. Porém, a norma dá prioridade para a destruição, ao estatuir que a devolução só ocorrerá quando o órgão competente deixar de autorizar a destruição da carga.

A preferência pela destruição causa preocupação, pois o escopo maior da legislação protetiva é o de impedir a chegada da carga no Brasil, e não dar a ela a destinação final. Ao privilegiar a destruição dos resíduos ilegalmente importados, a lei segue na contramão do princípio da prevenção, pelo qual devem ser criados mecanismos que impeçam a chegada desses resíduos ao Brasil, e não “legalizar” o procedimento de eliminação em nosso território.

Resgatando a Convenção firmada em Basiléia, na Suíça, em 22 de março de 1989, que trata do controle sobre a movimentação transfronteiriça de resíduos perigosos e outros resíduos e o seu depósito, a sistemática ideal deve envolver informação, cooperação e fiscalização entre as partes signatárias. O Brasil adotou a referida norma internacional pela promulgação do Decreto nº 875/93, destacando a necessidade de se coibir o tráfego ilícito dessas cargas. Portanto, é de se esperar uma coerência entre os compromissos firmados na Convenção da Basiléia e a legislação nacional.

Outro tema de destaque na MP 563/12 é a mudança na responsabilidade dos terminais e recintos alfandegados. A norma prevê que estes assumam a responsabilidade pelo cumprimento da determinação de destruição da mercadoria ilegalmente importada.

Anteriormente, a Resolução nº 02/91 do Conselho Nacional do Meio Ambiente estabelecia a responsabilidade do importador e do transportador em solidariedade pelas ações de prevenção, controle, tratamento e disposição final dos resíduos sólidos gerados por essas cargas. Com a MP 563/12, caso o importador não atenda à determinação da Aduana, quem deverá dar solução final (destruição) será o terminal ou recinto, o que, evidente, está fora de seu escopo comercial e viabilidade.

Melhor solução seria buscar mecanismos para reduzir a movimentação desses resíduos por meio de gestão ambiental na origem, determinando que os produtores assumissem a obrigação como principais geradores. Outra solução é controlar melhor o trânsito das cargas, conjugando mecanismos de informação, cooperação e fiscalização entre os países envolvidos.

Enfim, a MP 563/12 propõe uma solução para o problema da importação ilegal de resíduos, dando preferência pela eliminação das cargas e transferindo essa operação de destruição para os terminais e recintos alfandegados. Entretanto, a medida representa um retrocesso na concepção global de controle das movimentações desses resíduos.

Em se tratando de matéria afeta a setores cruciais e estratégicos que são o comércio internacional, os portos e a proteção ambiental, é importante que o País volte a promover o debate democrático para avançar no emprego de normas mais condizentes com o moderno pensamento global, ao invés de se utilizar de instrumentos excepcionais, como são as medidas provisórias.

[1]Advogado, sócio da Advocacia Ruy de Mello Miller, especializada em Direito Marítimo, Portuário e Aduaneiro – www.miller.adv.br

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